Alvo de críticas, comunicação do governo vive conflito e racha em equipe por controle dos perfis de Lula nas redes

Alvo de críticas por causa da piora dos índices de avaliação do governo revelada pelas pesquisas, a Secretaria de Comunicação Social (Secom) sofre com divisão interna e vê uma disputa pelo controle dos perfis pessoais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas redes sociais. A pasta também é uma das áreas com maior influência da primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja. Após o sinal de alerta com a queda da popularidade, o marqueteiro Sidônio Palmeira, que fez a campanha de 2022, entrou em campo.

Segundo levantamento do Datafolha divulgado na quinta-feira, o índice dos que avaliam a gestão federal como ruim ou péssima passou de 30% para 33% desde o fim de 2023. Em reunião ministerial, Lula se mostrou preocupado e cobrou dos auxiliares mais efetividade na comunicação.

Integrantes do governo afirmam, de forma reservada, que há uma relação tensa dos secretários José Chrispiniano (Imprensa) e Ricardo Stuckert (Produção e Divulgação de Conteúdo Audiovisual), próximos a Lula, com a também secretária Brunna Rosa (Análise, Estratégia e Articulação), ligada a Janja. Os problemas entre eles tiveram início ainda na campanha.

O trio cuida da estratégia da gestão petista nas redes sociais. Chrispiniano e Stuckert são responsáveis, respectivamente, pelo X (ex-Twitter) e pelo Instagram de Lula, enquanto Brunna coordena as contas governamentais.

O ministro da Secom, Paulo Pimenta, nega que disputas internas prejudiquem o trabalho. A primeira-dama disse que é “alvo da misoginia e do machismo enraizados na política e reverberados pela imprensa, que tentam tornar as mulheres o elo mais fraco”. Os secretários não comentaram.

Cabo de guerra

O colunista Lauro Jardim, do GLOBO, mostrou que Janja atua para transferir o controle das contas pessoais de Lula, hoje com Chrispiniano e Stuckert, para Brunna. O perfil pessoal permite uma atuação política clara, enquanto nas contas institucionais é exigido que seja seguido o princípio da impessoalidade. O antagonismo já foi exposto, inclusive, nas próprias plataformas. Em agosto do ano passado, Janja chegou a criticar nas redes a cor com a qual o vestido que usou na posse de Cristiano Zanin no Supremo Tribunal Federal apareceu em uma imagem. A foto havia sido feita por Stuckert, adepto de uma tonalidade mais azulada em sua produção fotográfica.

Pimenta diz que há “um processo permanente de ajuste da atuação nas redes”, mas nega a intenção de alterar os responsáveis pela administração de cada perfil. Janja afirma que é normal ter “opiniões sobre as redes pessoais do marido”, mas que as decisões cabem a Lula e Pimenta.

Aliados do presidente dizem que a tentativa da primeira-dama de interferir na linha de postagens começou antes mesmo da campanha eleitoral. O livro “Janja — a militante que se tornou primeira-dama” relata que a jornalista Nicole Briones, que era responsável pelas redes do petista desde a sua prisão em 2018, foi demitida no fim de 2021 por desavenças com Janja.

Stuckert trabalha com Lula desde o primeiro mandato, em 2003. Já Chrispiniano o assessora desde 2011, quando ele deixou o Planalto. Ambos se mantiveram ao lado do chefe do Executivo no período em que ele se tornou alvo da Operação Lava-Jato e passou 580 dias preso. Já Brunna foi contratada em 2018 e, ao longo da disputa eleitoral, se aproximou de Janja.

Com a vitória de Lula em 2022, os três foram nomeados para o governo em razão do trabalho na campanha e não pela escolha de Pimenta, apesar de serem seus auxiliares diretos. Brunna só ganhou status de secretária no fim do ano passado, em um movimento que foi atribuído a Janja — Pimenta e a primeira-dama negam.

No dia a dia do Planalto, do trio de secretários que atuam nas redes sociais, apenas Chrispiniano e Stuckert têm acesso direto e rotineiro a Lula, em virtude do longo período de convivência. O presidente não tem celular e, em geral, os assuntos relacionados ao mundo digital chegam a ele por meio de Janja.

Integrantes do governo dizem que há uma divergência sobre as estratégias de atuação nas redes entre os grupos da Secom. Críticos da atuação de Janja afirmam que ela defende publicações mais direcionadas a engajar eleitores de esquerda, por exemplo, com pautas de costumes. O outro grupo é favorável a uma linha que permita ao presidente retomar um diálogo mais amplo para tentar minimizar a polarização. No Instagram especificamente, há uma preocupação de apresentar Lula como um “estadista” — críticos dizem que a página se concentra muito no trabalho de Stuckert. Há no lado responsável pelos perfis institucionais uma reclamação também de que as contas pessoais não fazem referência às redes governamentais.

— Não é que existem disputas ou diferenças. São responsabilidades e papéis distintos que cada um tem dentro de uma mesma coordenação — afirma Pimenta. — A Janja é uma pessoa importante do governo, as opiniões são bem-vindas, mas não há nenhuma interferência direta.

Nos últimos meses, publicações feitas tanto na conta do presidente como na do governo geraram problemas para a Secom. Em 29 de janeiro, as redes institucionais ironizaram o vereador do Rio Carlos Bolsonaro, filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, que tinha sido alvo da Polícia Federal sob suspeita de ser beneficiário de uma suposta estrutura paralela dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) na gestão passada.

O post, com os dizeres “toc, toc ,toc”, tentava relacionar o episódio à campanha contra a dengue: “Quando os agentes comunitários de saúde baterem à sua porta, não tenha medo, apenas receba-os”. Assessores mostraram a Lula a postagem — ele não gostou e determinou que aquela linha não fosse mais adotada. A avaliação foi que a publicação era voltada apenas à parcela da população que tem simpatia pelo PT.

marqueteiro em brasília

Em 11 de fevereiro, uma menção ao nome da ex-primeira-dama Marisa Leticia, morta em 2017, foi cortada de um texto de Lula sobre o aniversário de 44 anos do PT postado no X. O mesmo texto tinha sido publicado no site da Fundação Perseu Abramo, braço teórico do partido. Luís Cláudio, um dos filhos de Lula, criticou o corte em postagem nas redes, e a publicação foi corrigida depois. A omissão do nome de Marisa foi atribuído a um receio de desagradar Janja. Os envolvidos na publicação negam e dizem que houve uma confusão porque havia duas versões do mesmo texto. Janja afirmou que não pode ser responsabilizada por “erros cometidos nas redes”.

Os problemas de comunicação do governo foram tema da reunião ministerial da última segunda-feira. Lula chegou a dizer que a esquerda está perdendo a guerra digital. Os ministros foram cobrados a atuarem de forma alinhada ao Planalto e ao presidente — a divergência interna, no entanto, é mais um obstáculo para a tarefa.

Depois da divulgação das últimas pesquisas, o marqueteiro Sidônio Palmeira, que fez a campanha de Lula em 2022 e trabalha para o PT, circulou por Brasília nas últimas semanas. Ele esteve com Lula no Palácio da Alvorada e também se reuniu com Pimenta. Sidônio chegou a ser convidado para comandar a Secom, antes da posse, mas recusou.

No mesmo período da passagem, a conta pessoal de Lula no Instagram publicou imagens do presidente correndo no Alvorada, em um tom que foge ao mais rotineiro do perfil. A publicação teve quase 1 milhão de curtidas, enquanto a maioria das feitas pelo presidente fica longe das 100 mil. Integrantes da equipe de comunicação, porém, negam interferência do marqueteiro.

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